Pensei na primavera.

O muito não me cabe. O desespero disfarçado de excesso, de essência, a busca incessante pela conquista a qualquer custo. Não importa quem está do outro lado da mesa: eu, ela, ele. Não é a mim, é a sensação de apaziguar uma carência, tampar um buraco, a necessidade do convívio em sociedade que não tem absolutamente nada a ver comigo. Sou inteira mesmo que armada. Não sou troféu de ninguém.

O pouco não me cabe. A indiferença disfarçada de plenitude, educação confundida com emoção, querer o outro bem não é sinônimo de amor é o que te diferencia da brutalidade do resto. Quero poesias, músicas, risadas, piadas de senso duvidoso, que você venha livre e assim permaneça mas que não finja, não se esforce para ficar. Não sou a compaixão de ninguém.

Eu falo, repito, tatuo, atuo e escrevo: o simples é o que mais me derruba. Simples não quer dizer morno, me encanta queimar. Simples quer dizer exatamente o que está escrito mas eu falo, explico, contextualizo e o simples se torna complicado. Não sou a expectativa de ninguém.

Por algum motivo sou romântica, insisto, persisto e deixo vir.

O vazio não me cabe. Sou inteira em cada coisa, no meio da multidão, no caminho pra casa, na inspiração, na mesa do bar. Tenho medo mas não me seguro. Sou minha própria esperança. Em casa me busco na rua me entrego, sorrio pra lua e corro com os meus. Deixo vir. Sou meu próprio universo.

Jaula de apartamento.

Tenho mania de colocar ‘hahaha’ depois de todas as mensagens. Não sei direito o porque, pensei nisso hoje de manhã. Coloco ‘.’ para mostrar que estou brava. Como se minha escrita passiva-agressiva não fizesse isso sozinha.

Parei na janela hoje de manhã ouvindo uma cantora nova, dessas que pegam na alma. Tem um friozinho gelado batendo no coração e um monte de minhocas se revirando no meu estômago. É, minhocas. Borboleta é coisa de adolescente. Então, as minhocas. Vi em uma notícia, dessas que aparecem sei lá da onde no nosso feed, que se você alimenta-las por 30 dias seguidos com coisas saudáveis elas soltam um trequinho para misturar na terra para as plantas crescerem bonitas. Coisas saudáveis são difíceis de encontrar.

Mentira.

Eu queria borboletas.

Em dias assim, meu coração bate sete vezes mais rápido que o normal. As mãos tremem e meu rosto procura o sol. Dá um alívio por cerca de seis minutos. Dentro desse espaço tempo até que é bom mas aí volta, sabe?

Apareçam formigas aqui em casa e ainda não descobri de onde elas vem. Aparecem no sofá, no meu braço, na minha perna. Deve ser das coisas doces que abandonei por aqui buscando por coisas mais doces ainda. Elas sobem consumindo o que coloco para fora, levando para outro lugar, repassando para as outras e me deixando amarga, desacreditada, medrosa.

Do que? De tudo. Das pontas dos dedo tão geladas, da pilha de roupas em cima da minha cama, da pia cheia de louça, de te deixar entrar. De todas essas palavras que eu jogo sem revisar. É coisa que eu faço, sabe?

Invento borboletas nas costas de minhocas.

*Lockdown/2020.