Chaves e batatas.

Um amigo anda preocupado com o avô que está no hospital. Odeio quando avôs vão para o hospital, seja para qualquer coisa. A minha preta vive em médico disso, médico daquilo, eu já falei pra ela parar e ir tomar uma cerveja comigo. Ela só toma cerveja preta.
E essa assunto de avós me lembrou do meu avô.

Meu avô morreu em novembro. Ele era grande e me chamava de Chica (Tchica) apesar de ser um puta italianão, falava alto, bem alto e com as mãos. Eu adorava o jeito que ele dançava, ele dava uma rebolada daquelas que você estica os braços para frente e balança pra lá e pra cá e as chaves batiam nele mesmo e ele ria. Me lembro do barulho das chaves misturadas com a risada e isso faz rir até hoje.
Lembro do dia que ele levou meu irmão para brincar no fliperama do Shopping Butantã e eu estava na escolinha, quando voltei para a casa da minha vó eles não estavam lá e achei aquilo estranho. Quando entraram pela porta fui direto perguntar onde estavam e meu avô me disse que tinham ido lavar o carro, só que meu irmão estava com um pacotinho de pipoca escrito “Shopping Butantã” e eu falei isso para ele. Ele riu alto “Mas olha só, já sabe ler Chica? Quanto tempo eu passei na rua?” e me levou pra comer algodão-doce.
Me lembro do quanto ele amava batata, seja ela frita, assada, no frango, talvez por ter sido batateiro na feira. Imagem o tamanho dele! Ele pode parecer muito maior pra mim, pela grande admiração, pelas risadas, pelos pulos que eu dava nele a toda hora, por pintar comigo o caderno de desenhos, me dar o primeiro gole de pinga, pelas tardes na cantina do colégio que ele trabalhava, pelo abrigo na chuva e por todas as vezes que me protegeu das baratas mutantes comedoras de Gabriela que apareciam na casa dele.
Nunca disse nada disso diretamente, mas nunca fomos de sensibilidades, com a gente era piada, risada, filme de velho oeste e jogo. De futebol, de vôlei, de basquete, de golf, a gente assistia qualquer coisa. Quer dizer, até ele dormir no sofá e eu colocar em outro canal.
Hey Seu Vicente, já passaram três anos desde o seu último sorriso mas ele tá aqui guardado comigo refletido em toda e qualquer risada minha. E vê se desiste, eu ainda não vou te dar um pedaço do meu cabelo para cobrir sua careca, acho que agora a cor não vai combinar muito. E nesse natal eu prometo me entupir de batatas igual a gente fazia.

7 comentários sobre “Chaves e batatas.

  1. Adorei!!!
    Uma grande homenagem a um grande homem!
    Meu querido e amado Pai.
    Tenho certeza, que ele tem grande orgulho de você, filha.
    Quanta preocupação ele teve com você, e no seu aniversário de um ano…”será que esta coca-cola é suficiente (para a sua festa) ? saía e quando voltava vinha carregado de mais coca-cola…..

    um beijo no seu coração.

    Mãe

  2. caiu ateh uma lagrima.. me fez lembra minha vó..
    mas ta mto lindo.. msmo, teu avo realmente c trata de um kra legal pela descriçao!

  3. Hey Dona Elizabeth, já passaram três anos desde o seu último sorriso mas ele tá aqui guardado comigo refletido em toda e qualquer risada minha.

  4. Legal Gabi….também me emocionei…
    Sinto saudades dele e do seu bom coração, tinha uma bondade imensa, jamais fez mal a alguém….como vc disse tão grande e tão doce…quando jovem parei de beijá-lo pois sentia vergonha disso…com o tempo, depois de amadurecer e me tornar adulto passei a beijá-lo amavelmente no rosto, ele ficava timido mas sinto que se emocionava….as vezes me apresentava para algum amigo dizendo, “este é meu filho” eu sintia um orgulho nas suas palavras, uma força muito boa….eu com certeza também sempre senti orgulho dele, simples, honesto, trabalhador e doce…o que eu nunca esqueço e o seu ultimo suspiro, por volta da 24h30 eu o segurava nos meus braços e desesperadamente o chamava, a fim de mante-lo acordado, mas hoje sei que aquele suspiro foi o seu último, pois quando os paramédicos chegaram ele já havia partido.
    Se foi cansado, querendo e desejando continuar na sua vida de trabahador, sem reclamar de nada….Vc e o Dani era uma alegria para ele….bom vc ter conhecido e que nunca o esqueça….eu adorava as minha avés mas não tive a sua felicidade de conhecer os meus avôs.
    Parabéns!
    Tio Lu

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